O jornalista, entre a
multidão e os algoritmos
Por
Carlos Castilho em 01/02/2013
A vida de
um repórter pode ter sido facilitada pelos novos gadgets eletrônicos e
pela internet, mas se olharmos pelo lado da busca de informações, o seu
trabalho ficou muito mais complexo, para dizer o mínimo. No jornalismo
tradicional bastava entrevistar a vítima, o agressor, a polícia e os advogados
para reunir o material essencial para uma notícia ou reportagem sobre um roubo
ou agressão pessoal, por exemplo.
Depois da
internet, o repórter tornou-se refém de duas instâncias impessoais,
imprevisíveis e numericamente imensas: as redes sociais, onde
circulam milhares de pessoas emitindo opiniões, divulgando dados, fatos e
eventos; e os robôs eletrônicos que, em quantidade incalculável,
circulam pela internet recolhendo informações que são depois indexadas e
processadas em bancos de dados, cujo funcionamento é sigiloso.
A
expressão “gastar sola de sapato”, transformada em apanágio da
investigação e checagem de fatos no jornalismo tradicional, está cada vez mais
inviável por conta da mudança radical na apuração de notícias. Gastar sola de
sapato ainda é uma opção válida para verificar a confiabilidade e exatidão de
um fato ou dado. Mas a prática foi atropelada pela avalancha de dados,
fatos e eventos a serem investigados, tornando compulsória a terceirização
da checagem jornalística.
Por isso,
hoje qualquer reportagem inevitavelmente passa pelo acesso à alguma rede social
ou por um sistema de buscas baseado em algoritmos, como é o caso do Google. O
profissional não tem o controle da qualidade informativa existente
nos dois ambientes. Isto significa que ele pode estar sendo induzido
involuntariamente a erro sem ter a menor ideia das possíveis consequências.
O
jornalista contemporâneo tornou-se ainda mais suscetível a equívocos do
que os profissionais da era da máquina de escrever e da sola de sapato. A
incerteza resulta do fato de que ele depende de outros serviços e de outras
pessoas para produzir um relato que é considerado a expressão da verdade
absoluta por um público que ainda não se deu conta da reviravolta no segmento
da imprensa.
Durante
décadas, as empresas jornalísticas passaram aos seus respectivos públicos a
ideia de que uma notícia impressa ou transmitida pelo rádio ou TV era
confiável, exata, relevante e inédita. Agora tudo isso é diferente, mas a
imprensa resiste em mostrar para sua audiência o que mudou e quais as
consequências. Prefere fazer de conta que está tudo bem e que os
problemas são passageiros, mesmo sabendo que a irritação do público com erros,
omissões e desvirtuamento de notícias vem crescendo continuamente.
O fato de
o jornalismo contemporâneo estar irremediavelmente dependente das multidões e
dos algoritmos para produzir notícias impede que ele continue pensando que é o
dono da verdade e única fonte confiável de informações. Não se trata de
fazer um voto de humildade, mas de reconhecer uma realidade e assumir as
consequências. A realidade é que, mais do que antes, o repórter necessita de
outras pessoas para fazer seu trabalho, e a consequência é a de que ele passa a
ser responsável perante elas pelo produto final .
Antes, o
repórter precisava se relacionar com seu chefe para manter o emprego e com suas
fontes de informação para ter o que oferecer ao chefe. Agora, ele precisa, além
disso, saber como se comportar em redes sociais, como trabalhar em grupo com
outros profissionais e como ouvir pessoas. As relações em rede são essenciais
porque nelas o repórter é apenas mais um membro, suscetível de críticas nem
sempre amenas em razão de eventuais erros ou desvios de conduta. A rede é o
caderninho de endereços do repórter. Ela agiliza o trabalho investigativo,
mas para isso o profissional precisa da colaboração dos membros da rede.
Trabalhar
em grupo passou a ser fundamental porque dificilmente um profissional
conseguirá saber usar e manter-se atualizado sobre todos os softwares
necessários para pesquisar um tema, interagir com fontes, produzir textos e
publicá-los, sem falar na eventual necessidade de editar e publicar fotos,
áudio ou vídeo.
Mas a
mais complicada das novas tarefas impostas aos jornalistas da era digital é
como ouvir pessoas. Até agora, o repórter assumia a personalidade de um
investigador, promotor ou juiz. Sua função era encontrar culpados ou
suspeitos, na maioria dos casos. Hoje, ele ainda precisa fazer isso, mas a
necessidade de contextualizar dados, fatos e eventos para poder transformá-los
em notícias relevantes, confiáveis e pertinentes o obriga a ter que ouvir
mais do que falar.
A
compreensão do contexto passa a ser essencial para que uma notícia seja
publicada e conquiste a atenção do público. A avalancha noticiosa na web tornou
imprescindível a diferenciação para que uma reportagem atraia leitores,
ouvintes, espectadores e internautas. Sem contexto, as pessoas não conseguem
identificar nem a importância e muito menos como uma notícia afetará suas
vidas. O repórter só pode obter tudo isso ouvindo pessoas e consultando fontes,
o que toma tempo e exige muita humildade – dois itens em falta nas
redações atuais.
Fonte: Observatório da Imprensa.
Um comentário:
Cara, sinceramente, não sei o que eles aprendem em quatro anos de faculdade.
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