A INTERNET E O FIM DA PRIVACIDADE
O que é público e o que é privado nos dias de hoje? A sua
sexualidade é privada? Tem certeza? Certo, você não comenta sobre ela no
Facebook ou Twitter, mas o que garante que o seu (sua) parceiro (a) não o fará?
Você fala mal do seu chefe em privado? Um simples celular pode filmar sua fala
e expô-la no Youtube. Qualquer ato ou fala sua pode ser gravada e reproduzida
por meios eletrônicos hoje. Um dos temas mais discutidos nos dias que correm é
sobre o fim da privacidade com a internet. Vivenciamos o auge da sociedade do
espetáculo. Tudo pode ser filmado, gravado, fotografado e colocado no Twitter,
Facebook ou Youtube. O mais interessante disso é que o fenômeno não está sendo
feito apenas pelo “Estado opressor e invasor da privacidade alheia” mas pelos
próprios indivíduos com seus semelhantes e consigo mesmos. Na verdade as redes
sociais são “vitrines vivas” onde a intimidade dos outros ou do próprio indivíduo
é escancarada, em alguns casos chegando a extremos ridículos.
Esta discussão às vezes fica complicada quando alguém
interpelado sobre o assunto declara em alto e bom som: “ninguém pode impedir
minha individualidade, vou postar o que quiser no Facebook”. Certo, desde que
você não reclame dos comentários. Se uma informação torna-se pública significa
que o público pode manifestar-se sobre ela. E, claro, estamos falando também da
invasão da privacidade dos outros.
Com tantos recursos tecnológicos visuais facilmente
encontráveis e manipuláveis a possibilidade de que sua vida possa ser invadida
e exposta em público aumentou consideravelmente. Ao se criar uma nova
tecnologia modificam-se certos hábitos culturais. Não há dúvidas de que o
voyeurismo e o narcisismo tornaram-se fenômenos de massa na internet.
Mas por que este debate é tão importante? Bem, os exemplos
que temos de fim da privacidade proveem, tanto em termos práticos como
literários, do totalitarismo. As ditaduras totalitárias que conhecemos
limitaram a privacidade de seus cidadãos. A vigilância do Estado cercou o
indivíduo a ponto de sua vida privada ser constantemente vigiada. A delação foi
estimulada. Não há dúvidas de que Hitler, Stálin e Mussolini adorariam o
Youtube e os celulares com capacidade para filmar e fotografar. Em “Farenheit
451” Ray Bradbury narra a vida de cidadãos proibidos de ter ou ler livros em
sua própria casa e todos são estimulados a delatar os desobedientes; em “1984”
o célebre George Orwell antecipa a atual mania paranoica das câmaras de
vigilância, inclusive dentro das residências particulares, com o intuito de
vigiar o comportamento dos cidadãos; em “Nós”, escrito ainda nos anos 20 do
século passado pelo russo Zamiátin, todas as casas do futuro são descritas como
sendo de vidro transparente. Assim a polícia e todo mundo fica sabendo o que se
passa no interior delas. O fim total da privacidade.
Você pode argumentar que os regimes totalitários e as
ditaduras são casos específicos e que vivemos em uma democracia. Claro que
vivemos. Por enquanto. Mas quem disse que ela durará para sempre? A história e a
luta de classes são dinâmicas e novas ondas autoritárias poderão vir no futuro.
Uma nova ditadura que porventura venha a existir no futuro adorará toda esta
parafernália eletrônica e a utilização delas para a vigilância e a delação. O
pior de tudo é que a atitude corrente de quebrar a nossa privacidade e a dos
outros tornará a população apta a aceitar de bom grado, em virtude do costume e
do discurso da “segurança”, este tipo de prática. O fim da privacidade é a
ascensão da delação. A próxima ditadura vai amar isso.
Aristóteles Lima Santana, 15/11/2013.
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